Resumo
Introdução: O uso e acesso a medicamentos e serviços de saúde constituem-se como medidas indiretas para avaliar o acesso
e a equidade de um sistema de saúde, e servem como importantes indicadores da situação de saúde da população [1, 2].
Compreender o uso de medicamentos na população brasileira pode esclarecer como ocorre o acesso da população ao tratamento de doenças, bem como identificar possíveis deficiências em políticas públicas relacionadas ao controle e uso racional desses medicamentos. Objetivos: Avaliar o uso e o acesso a medicamentos, a utilização de serviços de saúde e a situação de saúde populacional em dois períodos distintos na cidade de Manaus, Amazonas. Material e Método: Foram conduzidos estudos transversais em 2015 e 2019 na cidade de Manaus com amostragem probabilística em três estágios. A prevalência e fatores associados a sintomas depressivos e de ansiedade, doenças crônicas e multimorbidade, uso de serviços de saúde, consumo e falta de acesso a medicamentos, polifarmácia e potenciais interações medicamentosas, uso e automedicação com antibióticos e uso de psicotrópicos e antidepressivos foram avaliados por regressão de Poisson com variância robusta para calcular as razões de prevalência (RP) e intervalos de confiança (IC) de 95%. Resultados: Nos inquéritos de Manaus, foram incluídos 3.479 participantes em 2015 e 2.321 participantes em 2019. A maioria dos participantes eram mulheres (2015: 52,1%; 2019: 52,2%), autodeclarados pardos (2015: 72,9%; 2019: 72,1%), pertencentes à classe social C (2015: 57,4%; 2019: 53,6%) e com boa autopercepção de saúde (2015: 64,1%; 2019: 64,8%). Em 2019, a prevalência de sintomas depressivos foi 24,3% (IC95% 22,2-26,5%) e de ansiedade, 21,6% (IC95% 19,6-23,7%), enquanto 30,6% (IC95% 28,7;32,4%) apresentaram multimorbidade (média: 2,99 doenças crônicas), dos quais 28,8% receberam tratamento para multimorbidade. Entre 2015 e 2019, as consultas médicas passaram de 78,7% (IC95% 77,4-80,1%) para 76,3% (IC95% 74,6-78,1%), as internações hospitalares aumentaram (7,9%; IC95% 6,9-8,8% para 11,5%; IC95% 10,1-12,9%), enquanto a necessidade cirúrgica não atendida diminuiu (15,9%; IC95% 14,7-17,2% para 12,1%; IC95% 10,7-13,5%). Em 2019, metade da população de
Manaus consumiu medicamentos na quinzena anterior (53,2%; IC95% 50,7-55,7%); destes, 14% não conseguiram acessar
os tratamentos que precisavam. A polifarmácia foi observada em 2,8% (IC95% 2,1-3,6%) da população adulta e 8,9%
(IC95% 2,8-15,1%) entre idosos, com alta frequência de potenciais interações medicamentosas (74,0%). de 2015 a 2019,
observou-se aumento no uso (2015: 3,7%; IC95% 3,1-4,4%; 2019: 8,0%; IC95% 6,7- 9,3%) e a automedicação (2015:
19,2%; IC95% 12,4-26,0%; 2019: 30,7%; IC95% 22,5-38,8%) com antibióticos. Nesse período, a prevalência de uso de
psicotrópicos permaneceu estável (2015: 2,0%; IC95% 1,6-2,5%; 2019: 2,7%; IC95% 2,0-3,4%), ao passo que o uso de
antidepressivos passou de 0,4% (IC95% 0,2-0,7%) para 1,4% (0,9-1,9%). Discussão e Conclusões: Em 2019, a população adulta de Manaus apresentou alta carga de sofrimento mental, multimorbidade, consumo e falta de acesso a medicamentos, enquanto polifarmácia foi pouco frequente, mas com elevado risco de interações medicamentosas. Entre 2015 e 2019, as consultas médicas e as necessidades cirúrgicas não atendidas diminuíram, mas as internações hospitalares cresceram. O uso e a automedicação com antibióticos aumentaram, assim como o consumo de antidepressivos. Estes achados potencialmente indicam efeitos das medidas de austeridade instituídas no período, os possíveis efeitos no uso e acesso a medicamentos, utilização de serviços de saúde, e situação de saúde da população manauara.

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